Ivan, o Terrível: Entre a Grandeza e a Crueldade
No cenário tumultuado do século XVI, emergiu um líder que moldaria o destino da Rússia com uma força magnífica e, ao mesmo tempo, perturbadora: Ivan IV, conhecido como Ivan, o Terrível. Sua ascensão ao trono russo em 1547 marca não apenas a instauração da autocracia, mas o início de um reinado que ecoaria através dos séculos.
Ao conquistar terras vastas e ricas, como o Canato de Kazan e Astracã, Ivan se firmou como um líder militar inigualável. No entanto, por trás dessas façanhas, sua governança abraçou a brutalidade, especialmente durante a sombria Era da Opríchnina, quando a repressão interna atingiu níveis chocantes.
Este artigo explorará os extremos da personalidade de Ivan, os contornos de sua autocracia, e as tensões entre grandiosidade e crueldade que definiram seu legado. Ao desvendar os capítulos cruciais de seu reinado, buscamos compreender a complexidade de Ivan, o Terrível, e seu impacto duradouro na narrativa tumultuada da história russa.
Anos iniciais
Nascido em 1530, na cidade de Kolomenskoye, uma localidade próxima a Moscou, Rússia, Ivan IV assumiu o trono russo aos três anos de idade, após a morte de seu pai, Vassili III. Dada sua tenra idade, uma regência foi estabelecida para governar em seu nome.
Seu pai, Vassili III, havia trabalhado para consolidar o poder central, mas a morte prematura dele deixou a Rússia em um estado de incerteza. O país experimentava a fragmentação política, com principados independentes disputando o controle e enfrentando ameaças externas, como incursões mongóis.
O jovem Ivan, enquanto ainda sob regência, foi exposto a intriga política e à rivalidade entre as facções da nobreza. No entanto, o poder real só foi assumido por Ivan quando ele atingiu a maioridade, em 1547, marcando o início de seu reinado.
Ascensão de Ivan, o Terrível, em 1547
Sua ascensão ao poder efetivo em 1547, após atingir a maioridade, marcou o início de seu governo. Sua coroação como o primeiro czar russo simbolizou uma tentativa de consolidar o poder e unificar um país fragmentado. Sua coroação simbolizou a centralização do poder, mas a influência da nobreza persistiu, resultando em conflitos e desafios.
Os primeiros anos de Ivan no trono foram caracterizados por um desejo de fortalecer a autoridade central e expandir as fronteiras russas.
Um dos momentos destacados desse período foi a campanha militar contra o Canato de Kazan em 1552. A conquista de Kazan não apenas ampliou significativamente as fronteiras da Rússia, mas também consolidou a reputação de Ivan como líder militar habilidoso. Contudo, sua ambição expansionista não se limitou a Kazan; em 1556, ele voltou sua atenção para Astracã, garantindo o controle estratégico da foz do rio Volga.
Paralelamente a essas conquistas, Ivan iniciou reformas administrativas e legais para fortalecer o governo central. No entanto, sua tentativa de consolidar o poder resultou na introdução da opríchnina, uma fase sombria de seu reinado.
O Período de Retirada (1560-1564)
O período ao qual Ivan, o Terrível, se retirou do poder, conhecido como o “Tempo do Retiro de Ivan,” ocorreu após a morte de sua esposa, Anastasia Romanov, em 1560. Profundamente afetado por essa perda e por outros eventos traumáticos, Ivan optou por se retirar temporariamente do governo e das responsabilidades do trono.
Durante esse período, que se estendeu por vários anos, Ivan se isolou do governo e da administração do Estado. Essa retirada resultou em uma lacuna de poder, deixando o país sob o controle de boyares e outros funcionários, o que levou a uma crescente instabilidade política e social na Rússia.
Essa fase de retirada de Ivan é caracterizada por uma série de crises emocionais e introspecção. Enquanto alguns historiadores argumentam que seu afastamento foi uma estratégia para avaliar e consolidar seu poder, outros veem essa retirada como um reflexo do luto e do sofrimento pessoal de Ivan.
O “Tempo do Retiro de Ivan” não apenas ilustra a complexidade da personalidade de Ivan, mas também destaca como sua presença direta e sua liderança eram cruciais para manter a estabilidade no país. Sua posterior volta ao poder em um estado psicológico alterado marcou o início de uma fase mais autoritária e repressiva de seu governo, culminando na introdução da opríchnina e em eventos subsequentes que deixariam uma marca duradoura na história russa.
Criação do Opríchnina: A Implementação do Terror (1565-1572)
A Opríchnina foi uma fase distintiva e sombria durante o reinado de Ivan, o Terrível, na Rússia, que ocorreu entre 1565 e 1572. Esse período foi marcado por mudanças políticas, repressões brutais e uma série de medidas controversas que tiveram profundas ramificações na história russa.
A palavra “Opríchnina” deriva de “oprich” que significa “separado” ou “escolhido”. Em 1565, Ivan IV introduziu a Opríchnina como uma resposta a ameaças percebidas à sua autoridade, tanto internas quanto externas. Ele estabeleceu uma área separada chamada Opríchnina, onde detinha poder absoluto, removendo-a da administração regular do Estado. Essa região era controlada diretamente pelo czar e pelos opríchniki, uma guarda pessoal leal a Ivan.
Os opríchniki desempenharam um papel central na implementação das políticas de Ivan durante esse período. Vestidos de preto e montados em cavalos negros, esses guardas pessoais tornaram-se agentes do terror, responsáveis por aplicar a vontade do czar. Além de suas funções de segurança, os opríchniki estavam envolvidos em atividades repressivas, como perseguições, execuções e confisco de terras. A Opríchnina, assim, testemunhou uma brutalidade sem precedentes, levando a um clima de medo e incerteza em toda a Rússia.
O principal objetivo da Opríchnina era eliminar as ameaças percebidas à autoridade de Ivan, incluindo a nobreza que ele considerava traidora. Isso resultou em uma série de perseguições e execuções, muitas vezes arbitrárias, que não apenas enfraqueceram a aristocracia russa, mas também tiveram impactos econômicos significativos. Terras e propriedades daqueles considerados traidores foram confiscadas, contribuindo para a instabilidade econômica e social no país.
A cidade de Novgorod foi particularmente afetada durante a “Ira de Opríchnina” em 1569, quando Ivan conduziu uma repressão brutal nessa cidade historicamente significativa. Muitos nobres e cidadãos foram mortos, e a cidade sofreu uma devastação que a deixou marcada por décadas.
Além das perseguições internas, a Opríchnina também teve implicações externas. Ivan conduziu uma política externa agressiva, entrando em conflito com potências estrangeiras, incluindo a Suécia e a Polônia. A Opríchnina, portanto, contribuiu para um isolamento político da Rússia, enfraquecendo suas relações internacionais.
Morte de Ivan, o Terrível (1584)
Sua morte ocorreu em circunstâncias obscuras, e embora as causas exatas não sejam totalmente claras, acredita-se que tenha sido resultado de um acidente ou ferimentos autoinfligidos durante um acesso de raiva.
Por um lado, ele é lembrado por suas notáveis conquistas territoriais, incluindo a expansão das fronteiras russas para o leste e o sul. Suas campanhas militares bem-sucedidas contra os canatos mongóis, como Kazan e Astracã, consolidaram o poder russo e contribuíram para a formação do vasto Império Russo.
No entanto, o legado de Ivan, o Terrível, também é manchado por sua política interna repressiva, especialmente durante o período da Opríchnina. A introdução dessa fase sombria de seu governo, marcada por repressões brutais, perseguições e execuções arbitrárias, gerou um clima de medo e instabilidade na Rússia. A “Ira de Opríchnina” em Novgorod, em 1569, exemplifica a brutalidade associada a esse período.
Além disso, a política externa agressiva de Ivan, que resultou em conflitos com a Suécia e a Polônia, teve implicações duradouras nas relações internacionais da Rússia. Esses confrontos contribuíram para um período de isolamento temporário e tensões geopolíticas que ecoaram muito além do reinado de Ivan.
O legado de Ivan, o Terrível, é, portanto, uma mistura complexa de realizações notáveis e excessos brutais, refletindo a dualidade de sua personalidade e liderança.